quinta-feira, 14 de abril de 2011

Devagar quase parando

Antes de começar a falar sobre as cidades da Costa do Cacau, é preciso lembrar que uma das melhores coisas de estar na praia é não ter pressa. Estar na praia e na Bahia então é certeza de tempo mole. Quer exemplos?

O avião pousou em Ilhéus. O comandante tinha avisado que naquele dia fazia 30 graus. O bafo quente que subia da pista de voo, porém, queria me convencer a todo custo que fazia 35 ou até 40. Ah, a Bahia. Pedimos a primeira água de coco ainda no aeroporto, para refrescar. 5 minutos. Pense em 5 minutos para fazer isso: não é pouco. Principalmente se você está com sede.

Paramos no PONTO de táxi do AEROPORTO. Só tinham dois veículos disponíveis e já estavam ocupados. Quinze minutos para que algum chegasse. Almoço a beira da praia dos milionários, acostumada a receber turistas. Uma hora para ficar pronto. Mais? Em uma lojinha do centro, o moço demorou 20 minutos para tirar xerox de 40 páginas.

(A imagem veio desse link, com a legenda: Como diz a piada popular, a Bahia tem três ritmos: o lento, o muito lento e o Dorival Caymmi - um tempo devagar quase parando)

Eu odeio clichês. Essa coisa de tal povo é sem educação ou aquela cidade é uma simpatia são sempre questionáveis. Principalmente quando tratamos de pessoas, sempre mutáveis. Mas os clichês também não surgem por acaso... Nem me lembrava da fama e, mesmo assim, em pouco tempo pude confirmar que o baiano é devagar.

Não conheço toda a Bahia então também não vou generalizar. Já fui à Costa do Descobrimento e achei o ritmo normal. Até o momento, o vagareza é na Costa do Cacau. Foi um baiano da região, dono de um restaurante, trabalhador (e nem um pouco “devagar”, nos lembremos das exceções), que confirmou a teoria. Ele mesmo disse que, ali, as pessoas são mais lentas, que não sabem mexer com negócios. “Se vem cliente atrasado, não abrem as portas, se é difícil, vão deixando pra depois. Um dia mesmo eu liguei precisando de um tipo de peixe pra um grupo que me ligou em cima da hora e eles disseram sem ouvir os detalhes que só na semana que vem”.

(Em baixa temporada então, as barracas ficam vazias. E ótimas. Mas o serviço demora)

Origens

A região sempre foi rica. Primeiro o pau-brasil, depois a cana-de-açucar e, em seguida, o cacau, que trouxe grandes fortunas. Como contei no post passado, as condições climáticas eram perfeitas e durante os séculos XIX e XX a prosperidade era palavra de ordem. Fazendas enormes foram construídas, milhões de quilos de cacau foram colhidos e uma quantia enorme de dinheiro chegou à região.

Em 1985, porém, um fungo conhecido como vassoura de bruxa destruiu os cacaueiros e seus frutos. Um povo que foi criado na fartura e na riqueza precisou encontrar outras formas de sobreviver. Comércio, indústria ou turismo. A vida mansa (que não quer dizer fácil) ficou rápida. E com o amargo da perda.

E qual é o problema, afinal?

Ser lento pode ser ruim pra mim, urbana, acostumada com agilidade. Achamos que poupando 5 minutos aqui ou 5 minutos ali teremos uma hora a mais de descanso no fim do dia. Oi? Eu nunca encontrei esse tempo. Quem fica mais relaxado também não ganha horas de folga, mas aproveita bem melhor os minutos de descanso, sem a pressão de transformá-los em vida útil.

(Calor, vento, beleza e coco fresco. Pra quê a pressa?)

Isso não é uma desculpa para o mau funcionamento comercial. Servir uma água de coco em cinco minutos é demorado e pode destruir o humor de um executivo atrasado pra reunião. Mas esse jamais será um cliente. Então porque nos sentimos como executivos atrasados há todo momento? Na fala devagar e descompromissada do baiano (que eu, particularmente, adoro) já sentimos um desejo de diminuir o ritmo.

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